O risco como método: a beleza do imperfeito
- Luisa Sá
- 19 de set.
- 2 min de leitura
Vivemos cercados por sistemas de precisão. Interfaces limpas, grids bem ajustados, fluxos previsíveis, curvas perfeitas. No entanto, quanto mais os projetos se tornam eficientes, mais cresce o valor do que escapa do controle. Erros, ruídos, desajustes elementos antes associados à falha ou à falta de técnica, hoje revelam camadas de autenticidade, presença e humanidade.

No design, o risco passa a ser não um acidente a evitar, mas um método a explorar. Uma estratégia para romper o previsível, tencionar o discurso visual e criar brechas onde algo novo pode emergir. Projetar com intenção não é evitar o erro é saber escutá-lo, incorporá-lo e, às vezes, até provocá-lo.
Entre precisão e presença
Durante muito tempo, o ideal de um bom design esteve vinculado à noção de controle absoluto. Uma composição bem resolvida, um sistema visual estável, uma hierarquia clara de informação. Mas à medida que os códigos visuais se tornam mais homogêneos em grande parte pela automação de processos e pelo uso excessivo de templates o excesso de precisão começa a gerar um efeito colateral: o desaparecimento da presença.
É nesse cenário que o imperfeito ganha potência. Um espaçamento irregular, uma textura inesperada, uma tipografia que rompe a lógica do grid quando intencionais, esses desvios não comprometem a clareza, mas a enriquecem. Eles provocam fricção. Chamam a atenção para o detalhe. E convidam o olhar a permanecer.
O erro como linguagem
Assumir o risco como parte do processo é entender que o design não precisa nem deve ser imaculado. O erro pode ser índice de processo. Registro de percurso. E, mais do que isso, uma assinatura visual que escapa da lógica da padronização.
Em práticas como o design editorial experimental, o grafismo artístico, a composição de interiores com peças de acervo afetivo ou a materialidade imperfeita de uma parede mineral, o “erro” aparece como gesto de autonomia. Não é falta de cuidado. É excesso de intenção. É onde o projeto deixa de obedecer e começa a propor.
Esse tipo de escolha exige maturidade: saber quando a imperfeição contribui e quando ela atrapalha. Usar o risco não como desculpa para a negligência, mas como instrumento de presença crítica. O risco, quando bem conduzido, se transforma em potência poética.
Projetar com intuição e consciência
Incorporar o risco ao método de trabalho não significa abandonar a técnica. Pelo contrário: é colocar a técnica a serviço da intuição. É sair da zona de conforto. Explorar a fricção entre controle e descontrole. Aceitar que, às vezes, o que se quebra no caminho revela mais do que aquilo que se planejou com exatidão.
Projetar com esse olhar é cultivar um tipo de sensibilidade que não se aprende em tutoriais. Vem da escuta, do repertório, da abertura ao acaso. É onde o design se aproxima da arte mas sem perder seu compromisso com a função, o contexto e a intenção.
Comentários